QUEM MATOU OS PROGRAMAS DE REPORTAGENS ESPECIAIS?
Por muito tempo se dizia Brasil afora que o Rio Grande do Sul era um “celeiro” de grandes repórteres.
Pois hoje vivemos nos pampas uma aridez inédita no território que gerou tantos nomes que brilharam e ainda brilham em rede nacional.
O território onde tradicionalmente se exercita na plenitude a arte da reportagem: o dos programas de reportagens especiais.
Ficaram no passado as produções que concentravam os melhores recursos materiais e humanos das emissoras em busca de abordagens aprofundadas em temas de impacto.
O formato foi sendo gradualmente abandonado e hoje desapareceu da grade das redes.
A programação local, cada vez mais dominada pela grade nacional imposta pelo comando das redes, está restrita aos telejornais e um ou outro programa segmentado, geralmente na área de entretenimento.
Afinal o que decretou o fim destas produções em nível regional?
Sem dúvida, um fator que pesou muito foi a pressão das redes nacionais por mais espaço na grade de programação, o que vinha deixando cada vez menos tempo disponível para produções locais.
E no tempo que sobrou, os gestores em comunicação tem preferido investir em programações mais “leves” e de produção mais barata, como programas de entrevistas em estúdio e outros menos complicados operacionalmente e mais vazios em conteúdo.
Os programas de reportagens tem sido cada vez mais vistos como produtos pouco interessantes para os departamentos comerciais das emissoras, como se não pudessem captar bons anunciantes.
É uma cultura que se estabeleceu, para azar dos telespectadores.
EXEMPLOS DE SUCESSO NÃO FALTAM
O argumento dos gestores de que os programas de reportagens especiais são caros demais porque demandam muita estrutura especializada e viagens não se sustenta.
A TVE, que não é nenhum exemplo de emissora com dinheiro sobrando, mantém há anos o TVE Repórter, hoje o único programa na televisão gaúcha que se mantém fiel ao formato da reportagem especial.
equipe do TVE Repórter em ação
Mesmo com todas as dificuldades, a TVE, uma emissora pública com orçamento zero para investimentos tem conseguido produzir excelentes programas.
Outro exemplo que derruba a tese do alto custo é o programa O Rio Grande que dá Certo, veiculado pela Band RS de 2003 a 2007.
Conduzi o projeto da primeira edição até meados de 2006. A equipe era enxutíssima: repórter, cinegrafista e editor de imagens.
Com esta “mega estrutura” produzia-se programas semanais de 25 minutos viajando por todo o estado. O trabalho rendeu pelo menos 15 prêmios de reportagem, a maioria nacionais.
Equipe do Rio Grande que dá certo: Bira Mello, Azeredo e Jair Alberto
A RBS manteve até o final dos anos 80 o programa semanal RBS Documento, o equivalente regional do Globo Repórter.
Era conduzido pela tropa de elite da emissora. A editoria especial contava com os melhores da casa, e produziu reportagens de grande impacto por muitos anos.
Mesmo com o fim do RBS Documento, a cultura das produções especiais ainda sobreviveu por mais alguns anos na emissora líder.
No início dos 90 surgiram os programas Projeto Cone Sul e Projeto Ecologia.
Produções semanais que ao longo daquela década geraram grandes matérias que colecionaram prêmios e celebrizaram como poucos em nível regional a arte da grande reportagem.
Nos anos 2000 estes programas foram sendo substituídos por produções mais amenas como o Patrola e mais recentemente o Mistura . Todos voltados principalmente para o público jovem, abordando basicamente temas ligados à moda, música, diversões e afins.
Projeto Ecologia em campo: Azeredo, Enio Rosa,(Maguila), Monica Roemmler e Gilmar Tedesco ("60")
Ainda havia o programa de revista dominical TeleDomingo, que abrigava algumas matérias especiais impactantes. Mas este também acabou caindo da programação em 2015, depois de um longo processo de descaracterização.
Hoje, a RBSTV, uma das maiores redes regionais do país, com recursos de sobra e muitas equipes de alto nível, só produz grandes reportagens (com raríssimas exceções) quando são destinadas aos programas da Globo, como Fantástico e Globo Repórter.
Nunca mais houve um programa focado especialmente na produção de grandes matérias.
O mesmo ocorre com as emissoras gaúchas da Band, SBT e Record. E a TV Pampa, afiliada á Rede TV, não faz nenhum investimento em jornalismo além da tímida cobertura de uma equipe minúscula.
Tomara que a TVE sobreviva para continuar mantendo vivo o espírito destes programas, pois a julgar pela programação das demais, ela continuará será a única.
Azeredo e Milton Cougo - RS que dá certo