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A IMPRENSA E O IMAGINÁRIO POPULAR

- Tu é repórter da TV?? Ahá!! Então tu traça todas as gostosa!!

Assim começou o papo com o taxista que me levava para a TV. Eu usava uma vistosa camiseta da Rede Manchete, uniforme da emissora para a cobertura de carnaval em Porto Alegre.

Falando sempre pelo retrovisor, o sujeito estava animadíssimo com a minha presença no táxi dele. Eu, um repórter da TV Pampa em início de carreira, lá por 1986. Ele, que não me conhecia, parecia estar transportando uma celebridade:

- Bahh, nem vem meu, vocês da TV traçam aquelas mulhé das novela tudo!

- Meu amigo, sou apenas um repórter, não sou galã de novela...

- Ahh tá, me engana que eu gosto! As bonita cai tudo nas mão de vocês!

Meus esforços em convencê-lo de que aquilo tudo era pura imaginação não adiantaram. A visão dele de que profissionais da TV tudo podem era mais forte que meus argumentos.

Este episódio ilustra muito bem duas faces curiosas do imaginário popular sobre os profissionais da televisão: uma delas é a ilusão de que existe uma certa “intimidade”, pelo fato das pessoas estarem acostumadas a verem repórteres e apresentadores entrarem em suas casas todos os dias pela tela de TV da sala onde está toda a família.

A outra face é aura de poder que as pessoas conferem ao pessoal de TV como se estes fossem seres ungidos com a magia da sedução sem limites e da capacidade de resolver os mais variados problemas com o condão de uma reportagem.

Por conta disso, muita gente se sente á vontade para abordar jornalistas na rua e manifestar suas ansiedades, seus protestos, pedidos de ajuda ou simplesmente aproveitar a inesperada oportunidade de legitimar aquela suposta intimidade, puxando um singelo bate papo para tornar real a relação que eles alimentam pela fantasia da televisão.

ATENÇÃO E RESPEITO, SEMPRE!

É preciso ser tolerante e compreensivo com a falta de noção das pessoas. Elas não tem uma visão clara de como é a execução e o objetivo do nosso trabalho. Imaginam que tudo é instantâneo como o que aparece na TV. E muitos levam realmente a sério a ilusão de que há mesmo uma verdadeira proximidade entre eles e aquele repórter que vêem na telinha.

Há quem fique decepcionado ou mesmo irritado se o repórter, que nunca viu aquela pessoa antes, reage com certo estranhamento diante de uma abordagem excessivamente animada. Isso acontece porque muitos exageram na expectativa daquele contato, achando que o repórter reagirá com a mesma intensidade, como se fossem velhos conhecidos.

É preciso compreender esta postura e reagir sem ser grosseiro, dando a atenção possível com polidez e fazendo a pessoa entender que naquele momento não é possível conversar, pois há um trabalho em andamento, etc.

Não esqueça que a pessoa que aborda uma equipe de reportagem na rua pode estar trazendo uma boa pauta.

Não despreze aquele contato só porque a pessoa não soube se expressar bem num primeiro momento. Ouça o que ela diz e avalie se dá pra avançar na conversa.

Se o assunto render pauta, pegue as informações básicas e o contato para aprofundar a conversa mais tarde. Se não valer, explique suas razões com educação e peça licença para retomar seu trabalho.

Muitas vezes as pessoas abordam jornalistas pedindo ajuda para problemas pessoais, pois acreditam que uma reportagem pode ajudar a resolver questões de família, briga de vizinhos, querelas de condomínio, etc. Isso faz parte do imaginário popular sobre o poder da imprensa.

Seja sempre claro e respeitoso ao explicar porque aquele assunto não pode ser tratado pela imprensa como as pessoas imaginam.

E nunca prometa levar o assunto adiante só para se livrar da pessoa. É uma postura desonesta que cria falsa expectativa sem necessidade.

Lembre-se sempre: qualquer pessoa que te aborda na rua tem que ser bem tratada, bem recebida, com a melhor atenção que puder ser dada naquele momento, mesmo que se esteja no meio do trabalho.

Apesar da correria na reportagem, é preciso tratar as pessoas com dignidade, sempre! Seja para avaliar uma sugestão de pauta ou para dizer que não poderá ajudar.


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